Muros
O caminhão de lixo trabalhando nas horas ocultas
lixeiros verdes cintilantes correndo
sacos voando
luzes piscando
chorume escorrendo
. . .
Fugiram da cidade
adormeceram na areia
luzes
chumbo
e ação!
chumbo
e ação!
. . .
Na medida do provável
deitada no sofá
ela chamou por
“suplicante”
desligou a televisão
escutou um cão de longe
e esfregou o rosto no espelho
. . .
Uma bola amassada de papel-alumínio
uma chave quebrada
garoto estranho
sonhando baixo
visualizando rastros de vida sobre a mesa
Acaba um dia
perdendo o juízo
e some por aí
. . .
Tomaram todo café
esqueceram o final do filme
faróis de carros
CD
madrugada afora
. . .
O caminhão de lixo trabalhando nas horas ocultas
lixeiros verdes cintilantes correndo
sacos voando
luzes piscando
chorume escorrendo
. . .
Fugiram da cidade
adormeceram na areia
e na manhã seguinte
acordaram apenas dois do triângulo
a musica da cachoeira
Simone como água
Antônio como arma
. . .
Um relógio despertou
as veias agitaram em falso
e nenhum voltou no prazo
. . .
Nas lembranças
sobrou uma peça de xadrez
um cachimbo caricato
dissimulações
e a agonia alegre do tempo
. . .
Transformaram-se em sujeitos de trinta anos
um com a barriga mucha
outro falando espanhol
e Simone em análise profunda
. . .
As visitas sempre as mesmas
porém
cada vez mais raras
mais calvas
mais silenciosas
. . .
no cinema
no bar
no calor
na poeira
tudo continuava em paz
. . .
Dirigindo com um vestido curto
as paisagens se faziam translucidas
braços encostados
acendedor de cigarro
porta luvas
porta angústias
acelerador
depressores
. . .
Sem paciência para choro
utopias
e jazz
o sono era uma constante
. . .
A cidade iluminava a madrugada para ninguém ver...
Os três não dormiam
vacilavam pelas mesmas calçadas de antes
. . .
No final de um artigo
uma súbita tristeza abate o terceiro personagem
ele volta para casa
e desiste daquele futuro
estuda trompete
corta o cabelo
e pedala sua bicicleta numa panela municipal
. . .
Se falavam a cobrar
desejavam estar juntos
mas o telefone público era caro
. . .
Chegou a semana santa
e o teatro não abriu
porcos desfilaram pelas ruas
e Antônio escreveu mais um poema no feriado
. . .
No noticiário
o mundo como água ardente
(o abismo de Simone)
. . .
Mais uma viagem
algumas derrotas na mala
alívio
distância
. . .
As ondas quebrando
os trinta e seis anos chegando
os três em silêncio num mesmo tempo
. . .
páginas
faces
amigos de curta metragem
pic. Dani Ribeiro |
FIM.
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